Impacto na Educação

Análise a cargo de João Rodrigo Ornelas Catanho


A educação é uma das bases fundamentais para o desenvolvimento do país como um todo, pelo que a sua importância deve refletir-se no orçamento disponibilizado e nas medidas que deste constam e que a ela se referem. 

No orçamento do estado de 2024, está previsto um valor de 7 320 milhões para o "ensino básico e secundário e administração escolar", prevendo-se um crescimento de 5,7% face a 2023. Ainda assim, este aumento não representa um crescimento real, uma vez que a inflação verificada em 2023, segundo o INE, foi de 4,3%. 

Este valor representa cerca de 2,8% do PIB, sendo que com a junção de toda a despesa prevista desde a educação pré-escolar até ao ensino superior, o valor cresce para 4,2% do PIB. 

Segundo a Federação Nacional dos Professores, a 8 de janeiro de 2024, havia no mínimo 40500 alunos sem professores a uma ou mais disciplinas. A falta de professores deve-se ao facto da carreira docente não ser atrativa nos dias de hoje, uma vez que esta foi congelada entre 2005 e 2007 e entre 2011 e 2017, impedindo a progressão de escalões. Este congelamento, para além de prejudicar diretamente os professores já em funções, transmite também a ideia de que os professores não são valorizados em Portugal, desincentivando a entrada de novos professores. 

Neste sentido, uma medida muito popular consiste na recuperação do tempo de serviço dos professores. Esta medida é particularmente importante pois atuaria diretamente sobre este problema. A imposição desta medida para além de justa, e de demonstrar valorizar a profissão ao recuperar todos os anos perdidos, levaria também ao aumento exponencial da motivação dos professores o que afetaria positivamente o processo de aprendizagem dos alunos. 

Sendo o excedente orçamental verificado em 2023 de cerca 1,2% do PIB, ou seja, 3,19 mil milhões de euros e a verba desta medida, segundo o Ministro das Finanças, em torno de 300 milhões de euros, seria possível apenas com uma pequena parte do valor do excedente orçamental recuperar o tempo de serviço docente. Esta medida apesar de ser essencial para solucionar o problema que Portugal enfrenta hoje, não foi colocada no Orçamento do Estado de 2024, suscitando assim muitas críticas.

Por outro lado, está presente no Orçamento do Estado para 2024 uma medida que pretende apoiar as rendas de habitação dos professores deslocados, nas regiões de Lisboa e do Algarve. Esta medida destina-se a docentes que exercem a sua profissão numa escola a mais de 70 quilómetros da sua residência permanente, e com uma taxa de esforço acima dos 35% nos encargos com a habitação. Destina-se a fazer face à necessidade de contratar professores para escolas nestas zonas, uma vez que o elevado preço da habitação representa uma larga fatia do rendimento pessoal dos mesmos. A medida tem um custo previsto de 8 milhões de euros e pretende alcançar cerca de 8 mil professores, sendo 200 euros o valor máximo do subsídio. 

O Orçamento do Estado para 2024 propõe também um aumento anual de 3% dos vencimentos de todos os trabalhadores da administração pública, e consequentemente também dos professores, mas não prevê qualquer tipo de aumento específico à profissão, não obstante as precárias condições que enfrentam hoje. No entanto, note-se que a inflação prevista para 2024, segundo a OCDE, é de 3,3%, não havendo qualquer melhoria no poder de compra dos professores, mas pelo contrário uma redução. Já o Banco de Portugal, mais recentemente, aponta para uma taxa de inflação de 2,9%, e o Banco Central Europeu para uma taxa de 2.3%, previsão mais otimista. Ainda assim, não se pode afirmar que, caso algum destes valores venha a confirmar-se, haverá um aumento significativo do salário real dos professores. 

Também está previsto no Orçamento do Estado para 2024, um acréscimo de 25% no financiamento dos centros de recursos para inclusão. Além disso, em 2024, serão implementados projetos para fomentar o sucesso educativo nas regiões do Alentejo e do Algarve, mas também planos de promoção do sucesso escolar para alunos da comunidade cigana. Ainda é reconhecido no Orçamento de Estado para 2024 a necessidade de fortalecer as respostas aos alunos migrantes. 

No Orçamento do Estado para 2024, está ainda confirmado um aumento das verbas destinadas à realização de obras e aquisição de bens e serviços, no sentido de modernizar as escolas. A dotação prevista é de 710,9 milhões de euros, refletindo um aumento de 27,4% face ao ano anterior. Adicionalmente, estão também asseguradas verbas destinadas à manutenção e alargamento da gratuitidade de manuais escolares.


No âmbito das eleições legislativas de 2024, o tema da carreira docente foi falado inúmeras vezes, mostrando ser uma questão crucial a resolver. A Aliança Democrática apresentou no seu programa eleitoral a medida de "Iniciar a recuperação integral do tempo de serviço perdido dos professores, a ser implementada ao longo da legislatura, à razão de 20% ano". Por sua vez, o Partido Socialista refere no seu programa eleitoral a vontade de iniciar negociações com os representantes dos professores com vista à recuperação do tempo de serviço de forma faseada, mas não quantificando esse objetivo. O partido Chega também propõe recuperação integral do tempo de serviço dos professores, mas num prazo máximo de 4 anos. 

O atual governo, começou quinta-feira, dia 18 de abril, as negociações com os professores e, como prometido, o novo Ministro da Educação reafirmou o compromisso anunciado na campanha eleitoral de recuperar o tempo de serviço dos professores gradualmente, ou seja, recuperando 20% por ano ao longo de 5 anos. Nesta fase inicial das negociações foi divulgado que a Federação Nacional dos Professores (FENPROF) recusou esta proposta, exigindo uma recuperação integral em apenas 3 anos. 

Como referido anteriormente, a recuperação integral do tempo de serviço dos professores custará ao governo cerca de 300 milhões de euros, valor afirmado pelo ex-ministro das Finanças, Fernando Medina. Assim, uma recuperação anual de 20%, como prometido pelo governo atual, custaria ao Estado um acréscimo anual da despesa pública em 60 milhões durante 5 anos. 

No entanto, após 1 mês de negociação, dia 21 de maio, foi confirmado que será recuperado 25% já em setembro deste ano e outros 25% a 1 julho de 2025, totalizando uma recuperação de 50% do tempo de serviço docente em apenas 1 ano. Os restantes 50% serão devolvidos em 2026 e 2027. Deste modo, 150 milhões serão gastos durante este próximo ano e os restantes 150 milhões em 2026 e 2027, totalizando no final de 2027, um aumento permanente da despesa pública em 300 milhões de euros face a 2023. 

Análise de outras propostas 

1) Propinas e acesso ao Ensino Superior 

A CDU propõe no seu programa, a eliminação das propinas, taxas e emolumentos para todos os graus académicos. 

Com base nos dados fornecidos pelo Governo de Portugal, no ano letivo de 2022/2023 haviam 359 397 alunos inscritos no ensino superior, e uma vez que o valor anual das propinas numa universidade pública ronda os 697 euros, esta medida custaria ao Estado o valor aproximado de 250 milhões de euros. 

2) Alojamento estudantil 

Consta no programa do PS a vontade de continuar o reforço das condições de alojamento estudantil procurando atingir, em 2028, as 30 mil camas em oferta pública de alojamento. Já a AD propõe aumentar o investimento direto na construção e requalificação de residências, aproveitando também edifícios devolutos do Estado, além da contratualização com autarquias locais, instituições sociais e investidores privados para a construção de alojamento para estudantes e com residências estudantis privadas. 

Relativamente à proposta do PS, o objetivo de 30000 camas concretiza um aumento de 32,8% face a 2021/22, uma vez que, segundo o Jornal ECO, haviam 22600 camas em residências para estudantes nesse mesmo ano. 

Segundo a revista Nit, a nova residência universitária de Lisboa, inaugurada a 17 de abril, por meio de processos de reabilitação de edifícios, custou cerca de 17 milhões de euros. Esta residência universitária disponibiliza 208 quartos, tendo cada quarto um custo entre 84€ e 324€. Admitindo um preço médio de 200€ por quarto, o estado arrecada cerca de 374 Mil euros por ano letivo. (208 x 200 € x 9 meses = 374.400€). Tendo em conta que Lisboa é a região onde as rendas são mais caras, e onde há uma elevada procura pelos estudantes para seguirem o ensino superior, é assim a região que carece com mais urgência deste tipo de iniciativas. Assim, partindo do pressuposto que a receita obtida nos arrendamentos dos quartos será próxima dos gastos necessários para o funcionamento e manutenção dos mesmos, pode-se estimar que, iniciativas que procuram edificar novas residências universitárias, semelhantes à inaugurada, e em áreas próximas, terão um custo próximo aos 17 milhões de euros. Entendendo-se que o processo de construção ou reabilitação de edifícios durará 4 anos, o Estado teria então de suportar com esta medida de política económica de natureza expansionista cerca de 4,25 milhões de euros por ano, ao longo de 4 anos. 

3) Universalização do acesso gratuito ao ensino pré-escolar e creches 

Proposta pela AD, esta medida procura, de forma estrutural, mitigar as disparidades entre crianças de diferentes classes através do acesso ao ensino, sendo projetado para esta medida de natureza expansionista uma alocação de 400 milhões de euros. 

Estas 3 medidas vão ao encontro dos Objetivos de desenvolvimento sustentável, em particular, do objetivo número 4-Educação de qualidade, objetivo este que se refere à necessidade de garantir a igualdade no acesso à educação, assegurando uma educação mais inclusiva e de qualidade. Além disso, segundo a ONU, o conceito de pobreza vai além da falta de recursos e rendimentos que garantam meios de subsistência, pois abrange também o acesso à educação, à saúde e outros serviços básicos. Assim, as medidas referidas anteriormente, ao procurarem garantir a universalidade da educação, contribuem, direta ou indiretamente, para alcançar o objetivo 1 dos ODS – Erradicar a pobreza. 

4) Número de psicólogos 

O Bloco de Esquerda propôs no seu programa eleitoral de 2024 um reforço do número de psicólogos escolares, estabelecendo um rácio de 1 psicólogo por cada 500 alunos como meta. 

Segundo dados do PORDATA, há atualmente, cerca de 1,3 milhões de alunos matriculados desde o ensino básico ao ensino secundário, e uma vez que o número de alunos matriculados se manteve próximo nos últimos anos, no ano letivo 21/22, ano em que o rácio era de 1 psicólogo para 744 alunos, havia cerca de 1750 psicólogos escolares em funções. 

Quando a meta de 1 psicólogo por 500 alunos for alcançada, serão necessários 2600 psicólogos escolares, o que perfaz um aumento próximo dos 48%. É estimado que um psicólogo que exerça a sua função no setor público receba entre 1000 e 1500 euros. Assim, estabelecendo um salário médio de 1250 € por profissional, no ano letivo 21/22 eram necessários cerca de 2,19 milhões de euros (1750 x 1250 €). Já o objetivo de 1 psicólogo por 500 alunos, custará ao Estado aproximadamente 3,25 milhões de euros, concretizando, um aumento permanente da despesa pública de 1,06 milhões de euros face a 2022.

Esta proposta tem em vista promover a saúde mental e o bem-estar, alinhando-se com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, mas desta vez, com o objetivo número 3-Saúde de Qualidade. Uma saúde de qualidade, conforme este objetivo, vai para além da saúde física, reconhecendo a importância do bem-estar psicológico na construção de sociedades mais saudáveis e resilientes. 

As propostas analisadas anteriormente levarão a um aumento da despesa pública de aproximadamente 406 milhões de euros e a uma redução da receita pública de cerca de 250 milhões de euros, pelo que apesar de irem ao encontro de vários ODS, são medidas, que como verificado na conclusão do projeto, devem ser implementadas de forma gradual, pois perseguidas simultaneamente e em conjunto com as restantes medidas analisadas, em outros setores, podem pôr em causa a sustentabilidade das Finanças Públicas.

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